A intensidade do mar atinge as praias de Santa Catarina, evidenciando o grave impacto das mudanças climáticas e da ocupação desordenada. O nível do mar está subindo e essa elevação destruiu estruturas, recentemente, na movimentada Praia dos Ingleses, em Florianópolis, uma das regiões mais densamente habitadas da capital.
Em um cenário que desafia a crise, novas construções prosseguem “a todo vapor” na vizinha Praia do Santinho, aparentemente em cima de áreas de restinga. É fundamental que órgãos de controle e fiscalização, como a Fundação Municipal do Meio Ambiente (Floram), o Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA) e o Ministério Público, intervenham.
No entanto, o avanço das obras demonstra um paradoxo, muitas vezes amparado politicamente. O próprio Plano Diretor de Florianópolis fomenta um processo de urbanização sem a necessária infraestrutura ambiental e de uma análise das vulnerabilidades, interdependências e capacidade suporte do território.
O avanço da água coloca imóveis sob risco iminente de desabamento. Além dos prejuízos sociais e econômicos, há uma severa poluição: o lixo e os entulhos resultantes seguem mar adentro, causando ainda mais impactos.
A situação se repete em diversas praias do estado catarinense, de norte a sul. Alertas e decretos de emergência foram emitidos, além de Florianópolis, pelas prefeituras de Barra Velha, Barra do Sul, Garopaba, Itapema, Itapoá, Passo de Torres e São Francisco do Sul.
O professor doutor Paulo Horta, dos cursos de pós-graduação em oceanografia e ecologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), reitera que o aterro, ou a chamada engorda de praias, não oferece uma solução duradoura. Baseado em evidências científicas, ele defende a adoção de estratégias inspiradas na natureza.
“Precisamos rever a ocupação das dunas e restingas, restaurar a vegetação que pode ser chamada de florestas marinhas. Precisamos realizar um amplo e preciso diagnóstico e buscar inspiração na natureza para o desenvolvimento de soluções que reduzem a erosão, ao mesmo tempo que favorecem o balanço de sedimento. Além das restingas, mangues e recifes são conhecidos como soluções baseadas na natureza para conter a erosão costeira. Está na hora de ajudar a natureza para termos soluções resilientes e inteligentes para enfrentarmos as mudanças climáticas em nosso litoral”, aponta Horta.
O professor complementa, enfatizando a necessidade de um manejo territorial responsável: “É importante reforçar que essas soluções baseadas na natureza visam reduzir a energia das ondas, reter sedimentos ou construir defesas naturais. Mas isso não vai bastar pois nossas praias estão famintas de sedimento! Portanto, devemos também fomentar práticas responsáveis de uso do território, como evitar construções em áreas de dunas e restingas, gerenciar o escoamento superficial, avaliar os impactos da mineração de areia nos principais rios da região, assim como a centrais hidrelétricas e barragens, medidas que são cruciais para manter o balanço de sedimento com prevenção da erosão a longo prazo”, reforça.
Os avisos de pesquisadores e cientistas sobre os riscos no litoral do estado não são recentes. Em 2023 e 2025, a UFSC publicou notas técnicas que previram os desastres nas praias aterradas, denunciando que o alargamento da faixa de areia não iria resolver o problema do avanço do mar.
Um ponto crítico do diagnóstico é a falta de cumprimento de etapas pós-alargamento, como a restituição da restinga, vegetação essencial estudada pelo departamento de Ficologia. No caso da Praia dos Ingleses, os pesquisadores constataram a ausência total de mudas. O relatório técnico critica a gestão do desafio: “Essa constatação teve como base a concepção e gestão do problema relacionado com a proteção da costa, por um lado, e a observação da não realização das atividades planejadas e licenciadas, em particular aquelas relacionadas com o objetivo da ‘restauração ambiental’.”
Ou seja, apesar dos alertas, as autoridades não têm implementado medidas concretas. O resultado iminente, segundo os especialistas, é que o uso excessivo do concreto pode se tornar a lápide da ilha, que já foi mundialmente reconhecida por suas belezas naturais.
Com informações de Ciclo Vivo.






















